A Comissão de Educação da Câmara dos Deputados promoveu nesta, terça-feira (21), uma audiência pública para discutir o decreto que altera a estrutura e o funcionamento da Comissão Nacional de Residência Médica (Decreto 11.999/24) – órgão vinculado ao Ministério da Educação e que define normas para os programas de residência.
A iniciativa é do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), que destacou a necessidade de um debate aprofundado sobre as mudanças propostas pelo governo. Para ele, o decreto publicado no último mês de abril surpreendeu a classe médica ao dobrar o número de representantes do governo federal na Comissão de Residência. “Entidades Médicas repudiaram as mudanças. As entidades afirmam que as novas diretrizes podem comprometer a qualidade da formação de especialistas e acabar com o modelo atual da residência médica, reconhecido pela excelência”, destacou.
Para o DR. FRANCISCO EDUARDO CARDOSO ALVES, Médico Infectologista de São Paulo, esse novo decreto da Comissão Nacional de Especialidades Médicas é a tentativa de recriar o Mais Especialistas por dentro da estrutura da Residência Médica. “Há aqui uma clara confusão entre necessidade de ensino médico de excelência e necessidade de mercado de trabalho. Há aqui uma grande confusão entre formação profissional com a necessidade estatal. Quando você toma de assalto o controle da formação do profissional para atender a necessidade do programa estatal, você está matando a formação do especialista”, enfatizou.
Para ele, a Comissão virou um fantoche da Câmara Recursal, que é quem de fato vai mandar na Comissão Nacional de Residência Médica. “Isso é um aparelhamento tipicamente soviético, quando você tinha lá os comitês, os sovietes, você tinha o presidente, você tinha o representante do povo, você tinha o comissariado dos trabalhadores e você tinha o representante do Partido Comunista, era ele que mandava. Todos os outros cargos eram ficção, e é mais ou menos fazendo alusão ao que está acontecendo aqui. Nada da Comissão Nacional de Residência Médica agora vai conseguir ser aprovado sem que a Câmara Recursal dê ok. Quem compõe a Câmara Recursal? Só o governo. Quem vai indicar os especialistas médicos dessa banca de avaliação que se pretende fazer para normatizar a Residência Médica agora? É a AMB? Não. É o CFM? Não. É o governo. Qual é a expertise do MEC e do Ministério da Saúde para indicar tais especialistas? Como já foi dito aqui, a Residência Médica sempre foi o patinho feio do MEC e do Ministério da Saúde”, declarou.
MÁRCIO YURI FERREIRA, Conselheiro da Associação dos Estudantes de Medicina do Brasil - AEMED - BR, disse a associação é reconhecida pela defesa e busca incessante pela melhoria da qualidade do ensino médico no Brasil e firme posicionamento contra o ensino médico ou a representação estudantil pautada por ideologias. “Nós também acompanhamos de perto o cenário das residências médicas, pois o interesse é óbvio e direto com a nossa atuação na vida de todos os estudantes do país”, destacou.
Ele ressalta que o médico tem a capacidade de salvar a vida, mas o médico mal formado tem a capacidade também de tirar a vida ou de trazer problemas sérios para a vida e para a família de uma pessoa, de um paciente. “Especificamente em relação ao decreto, a EMED Brasil considera que é um completo retrocesso na educação do médico e para a saúde pública do nosso país. O decreto tem objetivo de centralização de poder nas mãos do governo federal vigente, retirando a possibilidade de debates que irão direcionar o futuro das residências médicas. É um cenário que hoje urge por melhorias pautadas por elementos técnicos e elementos científicos. Portanto, o decreto gera um completo desequilíbrio em relação à participação do elemento técnico científico e a participação dos interesses do governo vigente, fica sobreposta a todas as outras decisões e elementos”, enfatizou.
Para o PROFESSOR DR. WUILKER KNONER CAMPOS, Professor e Presidente da Sociedade Brasileira de Nefrologia - SBN, essa atitude imposta de baixo para cima para a comissão técnica de residência médica é altamente danosa para a saúde do Brasil. “O que o Mais Médico é, hoje, no interior do Brasil? É o famoso médico au-au. O que é o au-au? Au-cardiologista, au-radiologista, au-urologista. Ele só encaminha. A princípio, ele está dando à população um atendimento, mas, na verdade, uma telemedicina resolveria essa questão”, declarou.
Segundo ele, nos últimos dez anos crescemos menos de 20%. “A gente viu que algumas escolas de neurocirurgia estavam sendo danosas para a população. A gente começou a ver atrocidades. E se tem uma especialidade que vê atrocidade, é a neurocirurgia, é a cirurgia cardíaca, quem está na porta, no trauma, nessas condições mais graves de saúde que tem que atender e que o erro não é permitido. Não é permitido a qualquer médico, da urologia, da neurologia, da infecto, o erro. Por isso que existe esse nível, essa régua tão alta de qualificação. A gente tem que focar na qualificação”, enfatizou. “Eu já presenciei muitos colegas de várias especialidades, recebendo colegas estrangeiros para capacitar esses colegas. Nós desenvolvemos técnicas que são citadas no mundo todo, publicadas e, às vezes, os colegas médicos de outro país vêm aprender aqui com a gente também. Então, a gente virou um modelo de qualidade, porque desde sempre a qualidade foi o ponto principal da Comissão Nacional de Residência e nunca a quantidade”, finalizou.
Parlamentares
Para o deputado Doutor Osmar Terra (MDB-RS), a residência médica está num foco decisivo para a qualidade de atendimento. “Nós queremos que a nossa população esteja bem atendida, ser atendida de qualquer jeito para dizer que está sendo atendida, eu acho que é um erro”, disse.
O deputado Luiz Ovando (PP-MS), disse que hoje a medicina está numa situação precária. “Nós saímos do clínico. Então criou-se aí uma série de arranjos na tentativa de resolver o problema clínico. O indivíduo quando recebe o paciente diz assim, como é que eu vou me livrar desse chato na minha frente? Vou encaminhar ele para cá e para lá. É isso que acontece. E aí vem a ideologia e diz assim, nós precisamos de mais médicos. Precisamos qualificar, porque quando você é qualificado e você vai para o interior, você causa mudança necessária naquele lugar”, enfatizou.
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